Eulália
Deixei-a solitária, por uns dias,
Enquanto melhorava do ciúme,
E saí pra evitar muitas porfias
Que entre nós já se davam — de costume.
Nesse tempo eu andava arruinado!
As brigas entre nós, freqüentemente,
Transformaram a abelha do passado
Numa aranha de dor — sempre presente!
Então o inseto que fazia, outrora,
Mel de carícias na feliz colmeia,
Vinha fazendo entre nós dois, agora,
O fel da vida — numa horrível teia!
Corri mundos... andei por terra estranha
Procurando renúncia, esquecimento…
Mas dia-a-dia se infiltrava a aranha
Na teia enorme do meu pensamento!
Mandava-lhe presentes de onde estava,
Escrevia-lhe cartas carinhosas
Pedindo que esperasse que eu voltava
E novamente nasceriam rosas…
Mas, uma noite, (Triste noite, amigo!)
Eu entrei num Cassino... (Que amargura!)
Ai! Não chores de ouvir o que te digo
Nem te rias da minha desventura!
A sala estava cheia do cinismo
Dos que, no vício, vão matar a sede…
Era urra antro de fumo e de alcoolismo,
Com visões sensuais pela parede!
Um perfume de bétulas e sândalos
Rescendia da carne em sedas finas,
E a luz — envergonhada dos escândalos —
Parecia tremer... sob as cortinas!
A dona do Cassino, a abelha-mestra
Do cortiço infeliz, torpe e devasso,
Dava bebida aos maganões da orquestra
E mandava agitar sempre o compasso…
Enquanto os instrumentos gargalhavam
Na frivolência do pagode insano,
Eu distinguia as notas que choravam
Nas cordas ultrajadas de um piano!
Mais tarde, (Era o intervalo do pecado!)
Enquanto a orquestra demorava o ensaio,
A pianista, curvando-se ao teclado,
Dedilhava a canção ROSA DE MAIO…
Era aquela canção — quando partimos —
A que Eulália tocava todo mês…
Pois foi no mês de maio que nos vimos,
Eulália e eu — pela primeira vez!
Recordação... Saudade ... Sofrimento…
Aproximei-me sem saber por quê…
— Era Eulália que estava no instrumento!
Sim, Eulália... vestida de “soirée”!
Quando me viu eu vi também seu vulto
Afogar-se nas brumas de um desmaio…
E até hoje em minh’alma um piano oculto
Vive sempre a tocar ROSA DE MAIO!...
A bordo do “Rio-Mar” — Amazonas, 26-01-48.
Enquanto melhorava do ciúme,
E saí pra evitar muitas porfias
Que entre nós já se davam — de costume.
Nesse tempo eu andava arruinado!
As brigas entre nós, freqüentemente,
Transformaram a abelha do passado
Numa aranha de dor — sempre presente!
Então o inseto que fazia, outrora,
Mel de carícias na feliz colmeia,
Vinha fazendo entre nós dois, agora,
O fel da vida — numa horrível teia!
Corri mundos... andei por terra estranha
Procurando renúncia, esquecimento…
Mas dia-a-dia se infiltrava a aranha
Na teia enorme do meu pensamento!
Mandava-lhe presentes de onde estava,
Escrevia-lhe cartas carinhosas
Pedindo que esperasse que eu voltava
E novamente nasceriam rosas…
Mas, uma noite, (Triste noite, amigo!)
Eu entrei num Cassino... (Que amargura!)
Ai! Não chores de ouvir o que te digo
Nem te rias da minha desventura!
A sala estava cheia do cinismo
Dos que, no vício, vão matar a sede…
Era urra antro de fumo e de alcoolismo,
Com visões sensuais pela parede!
Um perfume de bétulas e sândalos
Rescendia da carne em sedas finas,
E a luz — envergonhada dos escândalos —
Parecia tremer... sob as cortinas!
A dona do Cassino, a abelha-mestra
Do cortiço infeliz, torpe e devasso,
Dava bebida aos maganões da orquestra
E mandava agitar sempre o compasso…
Enquanto os instrumentos gargalhavam
Na frivolência do pagode insano,
Eu distinguia as notas que choravam
Nas cordas ultrajadas de um piano!
Mais tarde, (Era o intervalo do pecado!)
Enquanto a orquestra demorava o ensaio,
A pianista, curvando-se ao teclado,
Dedilhava a canção ROSA DE MAIO…
Era aquela canção — quando partimos —
A que Eulália tocava todo mês…
Pois foi no mês de maio que nos vimos,
Eulália e eu — pela primeira vez!
Recordação... Saudade ... Sofrimento…
Aproximei-me sem saber por quê…
— Era Eulália que estava no instrumento!
Sim, Eulália... vestida de “soirée”!
Quando me viu eu vi também seu vulto
Afogar-se nas brumas de um desmaio…
E até hoje em minh’alma um piano oculto
Vive sempre a tocar ROSA DE MAIO!...
A bordo do “Rio-Mar” — Amazonas, 26-01-48.