Os Expedicionários Cearenses
Deus acompanhe o peregrino audaz!
Castro Alves
Que coorte imensa e brava
Correndo as ruas está?
São guerreiros debuxados
Nas tendas do Ceará!
São brônzeos bustos heróicos,
Hercúleos, firmes, estóicos,
Filhos do “Berço da Luz”,
Que vão buscar a vitória
Marcando mais uma glória
Da Terra de Santa Cruz!
Que rasgo intenso de fogo
O deus Marte abriu no ar!
Netuno, estendendo o braço,
Ordena silêncio ao mar…
As ondas não mais estalam,
As ventanias se calam
Temendo a voz do perigo,
São patrícios de Sampaio
Que vão despejar o raio
Nas fronteiras do inimigo!
Um silvo agudo e sinistro
Sai dos brônquios do vapor;
A hélice corta os ares
À ordem do aviador;
Em baixo — o barco cintila,
Em cima — o avião oscila
Fitando o abismo sem fim…
E o mar, no seu negro engaste,
Copia fundo contraste
Sob o céu de alvo cetim!
Aos acenos de Colombo
Segue o capitão, veloz;
De Santos Dumont, nos ares,
O piloto escuta a voz;
No mar — o titã peleja,
Nos céus — o condor fareja
O submarino sutil,
— Essa audaz praga germânica
Para cuja grei satânica
Pede vingança o Brasil!
No céu escorregam nuvens,
Da lua esmagando o brilho;
Os guerreiros se acumulam
No largo do tombadilho;
Seus olhos na Glória fitos
Escrevem nos infinitos
Pontos de interrogação…
Que dramas não se praticam
Entre o pranto dos que ficam
E os adeuses dos que vão!...
Abrindo verdes bandeiras
Tremem coqueiros na praia;
Os heróis contemplam, longe,
A cidade que desmaia…
À proporção avançada
Vai se tornando apagada
A sombra escusa da terra…
Os bravos já se esconderam
Entre a Pátria em que nasceram
E o mundo que inventou guerra!
Num deserto de águas negras
O barco se encontra só…
A chaminé fatigada
Vomita nuvens de pó!
As ondas tornam-se roxas
Por entre as espumas frouxas
Do bojo hiante do mar!
São desgraçados indícios
Dos nossos caros patrícios
Pedindo para os vingar!
Na fria brisa dos mares
Perpassa rouca uma voz
Murmurando em desespero:
“— Vingai-nos daquele algoz!”
E nesse tredo minuto
Cinco gigantes de luto
Ressurgem tristes ali:
— Sou Aníbal! (tudo pára)
— Ararás! — Araraquara!
— Itagiba! — Baependi!
Com a presença desses monstros
Escureceu o horizonte!
— Cada gigante trazia
A morte escrita na fronte —
O céu conjurou as pragas,
O mar segredou as vagas,
Houve um silêncio invulgar…
E em gemidos delirantes
Os enlutados gigantes
Começaram a falar:
“— Somos nós os titãs bravos
Que o mar do Brasil criou
E que nessas mesmas águas
O nazista nos matou!
Representamos as vidas
Que aqui foram destruídas
Do convés ao tombadilho!
Somos o pranto queixoso
Da esposa por seu esposo,
Da triste mãe por seu filho!
Vêde essa eterna agonia
Que se nos estampa à face
Em cada noite que morre,
em cada dia que nasce!
Esse inferno de água escura
Foi a triste sepultura
De vossa incauta irmandade,
No dia em que Hitler fez
O luto — para a viuvez,
O choro — para a orfandade!
Dentro de nossas entranhas
Palpitam vozes trementes
De donzelas — por seus noivos,
De pais — por seus inocentes!
E essas almas desgraçadas
Hão de viver encarnadas
Gritando dentro de nós!
E nessas terríveis mágoas
Mandam-nos à flor das águas
Para vingar seu algoz!
Somos nós que estamos mortos
E vós que vivos estais
Então acabai a raça
Dos infames canibais!
Ide ao covil das serpentes,
Rasgai-as com os vossos dentes,
Torcei-as com as vossas mãos!
Não deixeis o seu veneno
Fulminar vosso terreno,
Devorar vossos irmãos!
Lembrai Osório, Caxias,
Barroso e Tamandaré!
Quem no Brasil foi nascido
Brasileiro sempre é…
Pois se do Brasil sois filhos
Manejai vossos gatilhos
Em defesa desse pai.
Ide! Correi! Tomai parte,
Relembrando o bacamarte
Da Guerra do Paraguai!”
Proferindo essas palavras
Desceram de novo ao fundo…
O mar pintou-se de sangue,
O céu ficou mais profundo!
Cristóvão gemeu nos mares
E Alberto gritou dos ares:
“— Tu queres asas, Titão?...”
Na gávea surgiu Barroso
E Andrada — sempre orgulhoso —
Desdobrou seu Pavilhão!
Montando um corcel de fogo,
Relampejando bravura,
Caxias abria um túnel
Por dentro da noite escura!
Ouviam-se gritos cavos
De muitos milhões de bravos
Que à Glória fizeram jus;
E uma voz comandante
Repetia: — Avante! — Avante!
Bravos da Terra de Luz!
Que epopéia indescritível
Dentro das águas se dá?
São guerreiros debuxados
Nas tendas do Ceará!
São patrícios de Sampaio
Que vão despejar o raio
Que ordena o céu da Nação!
São os irmãos de Iracema
Que vão compor um poema
Dos despojos do alemão!
Vão para as terras de Itália
Testemunhar — bem se sabe —
Um novo Geena horrível
Que no vesúvio não cabe!
Pois o báratro moderno
É pior que aquele inferno
Que o Dante em fogo pintou;
Não a Divina Comédia,
Mas essa infernal tragédia
Que Adolph Hitler criou!
Deixando os “mares bravios”
Os heróis pisam em terra
Por entre o véu gangrenoso
Do fumo negro da guerra!
Em meios aos tanks enormes
E os poucos canhões disformes
Um grande chefe os conduz…
É seu bravo comandante
Insistindo: — Avante! — Avante!
Soldados de Santa Cruz!
Uma prece corta os ares
Buscando Deus! Quem será?
Suas mães, esposas, filhas
Dos heróis do Ceará!
Como as mulheres de Esparta
Elas aguardam a carta
De uma vitória feliz;
E entre o fogo das metralhas
Eles conquistam medalhas
Para enfeitar seu país!
Fortaleza, 1945.
Castro Alves
Que coorte imensa e brava
Correndo as ruas está?
São guerreiros debuxados
Nas tendas do Ceará!
São brônzeos bustos heróicos,
Hercúleos, firmes, estóicos,
Filhos do “Berço da Luz”,
Que vão buscar a vitória
Marcando mais uma glória
Da Terra de Santa Cruz!
Que rasgo intenso de fogo
O deus Marte abriu no ar!
Netuno, estendendo o braço,
Ordena silêncio ao mar…
As ondas não mais estalam,
As ventanias se calam
Temendo a voz do perigo,
São patrícios de Sampaio
Que vão despejar o raio
Nas fronteiras do inimigo!
Um silvo agudo e sinistro
Sai dos brônquios do vapor;
A hélice corta os ares
À ordem do aviador;
Em baixo — o barco cintila,
Em cima — o avião oscila
Fitando o abismo sem fim…
E o mar, no seu negro engaste,
Copia fundo contraste
Sob o céu de alvo cetim!
Aos acenos de Colombo
Segue o capitão, veloz;
De Santos Dumont, nos ares,
O piloto escuta a voz;
No mar — o titã peleja,
Nos céus — o condor fareja
O submarino sutil,
— Essa audaz praga germânica
Para cuja grei satânica
Pede vingança o Brasil!
No céu escorregam nuvens,
Da lua esmagando o brilho;
Os guerreiros se acumulam
No largo do tombadilho;
Seus olhos na Glória fitos
Escrevem nos infinitos
Pontos de interrogação…
Que dramas não se praticam
Entre o pranto dos que ficam
E os adeuses dos que vão!...
Abrindo verdes bandeiras
Tremem coqueiros na praia;
Os heróis contemplam, longe,
A cidade que desmaia…
À proporção avançada
Vai se tornando apagada
A sombra escusa da terra…
Os bravos já se esconderam
Entre a Pátria em que nasceram
E o mundo que inventou guerra!
Num deserto de águas negras
O barco se encontra só…
A chaminé fatigada
Vomita nuvens de pó!
As ondas tornam-se roxas
Por entre as espumas frouxas
Do bojo hiante do mar!
São desgraçados indícios
Dos nossos caros patrícios
Pedindo para os vingar!
Na fria brisa dos mares
Perpassa rouca uma voz
Murmurando em desespero:
“— Vingai-nos daquele algoz!”
E nesse tredo minuto
Cinco gigantes de luto
Ressurgem tristes ali:
— Sou Aníbal! (tudo pára)
— Ararás! — Araraquara!
— Itagiba! — Baependi!
Com a presença desses monstros
Escureceu o horizonte!
— Cada gigante trazia
A morte escrita na fronte —
O céu conjurou as pragas,
O mar segredou as vagas,
Houve um silêncio invulgar…
E em gemidos delirantes
Os enlutados gigantes
Começaram a falar:
“— Somos nós os titãs bravos
Que o mar do Brasil criou
E que nessas mesmas águas
O nazista nos matou!
Representamos as vidas
Que aqui foram destruídas
Do convés ao tombadilho!
Somos o pranto queixoso
Da esposa por seu esposo,
Da triste mãe por seu filho!
Vêde essa eterna agonia
Que se nos estampa à face
Em cada noite que morre,
em cada dia que nasce!
Esse inferno de água escura
Foi a triste sepultura
De vossa incauta irmandade,
No dia em que Hitler fez
O luto — para a viuvez,
O choro — para a orfandade!
Dentro de nossas entranhas
Palpitam vozes trementes
De donzelas — por seus noivos,
De pais — por seus inocentes!
E essas almas desgraçadas
Hão de viver encarnadas
Gritando dentro de nós!
E nessas terríveis mágoas
Mandam-nos à flor das águas
Para vingar seu algoz!
Somos nós que estamos mortos
E vós que vivos estais
Então acabai a raça
Dos infames canibais!
Ide ao covil das serpentes,
Rasgai-as com os vossos dentes,
Torcei-as com as vossas mãos!
Não deixeis o seu veneno
Fulminar vosso terreno,
Devorar vossos irmãos!
Lembrai Osório, Caxias,
Barroso e Tamandaré!
Quem no Brasil foi nascido
Brasileiro sempre é…
Pois se do Brasil sois filhos
Manejai vossos gatilhos
Em defesa desse pai.
Ide! Correi! Tomai parte,
Relembrando o bacamarte
Da Guerra do Paraguai!”
Proferindo essas palavras
Desceram de novo ao fundo…
O mar pintou-se de sangue,
O céu ficou mais profundo!
Cristóvão gemeu nos mares
E Alberto gritou dos ares:
“— Tu queres asas, Titão?...”
Na gávea surgiu Barroso
E Andrada — sempre orgulhoso —
Desdobrou seu Pavilhão!
Montando um corcel de fogo,
Relampejando bravura,
Caxias abria um túnel
Por dentro da noite escura!
Ouviam-se gritos cavos
De muitos milhões de bravos
Que à Glória fizeram jus;
E uma voz comandante
Repetia: — Avante! — Avante!
Bravos da Terra de Luz!
Que epopéia indescritível
Dentro das águas se dá?
São guerreiros debuxados
Nas tendas do Ceará!
São patrícios de Sampaio
Que vão despejar o raio
Que ordena o céu da Nação!
São os irmãos de Iracema
Que vão compor um poema
Dos despojos do alemão!
Vão para as terras de Itália
Testemunhar — bem se sabe —
Um novo Geena horrível
Que no vesúvio não cabe!
Pois o báratro moderno
É pior que aquele inferno
Que o Dante em fogo pintou;
Não a Divina Comédia,
Mas essa infernal tragédia
Que Adolph Hitler criou!
Deixando os “mares bravios”
Os heróis pisam em terra
Por entre o véu gangrenoso
Do fumo negro da guerra!
Em meios aos tanks enormes
E os poucos canhões disformes
Um grande chefe os conduz…
É seu bravo comandante
Insistindo: — Avante! — Avante!
Soldados de Santa Cruz!
Uma prece corta os ares
Buscando Deus! Quem será?
Suas mães, esposas, filhas
Dos heróis do Ceará!
Como as mulheres de Esparta
Elas aguardam a carta
De uma vitória feliz;
E entre o fogo das metralhas
Eles conquistam medalhas
Para enfeitar seu país!
Fortaleza, 1945.